Uma das histórias que mais rendeu debate e polêmica na temporada regular de 2016 foi a queda de rendimento de Aaron Rodgers e do ataque do Packers como um todo.Como tinha apontado as estatísticas, o passer rating de Rodgers vinha decaíndo desde a temporada 2015.Um dos QBs mais atléticos e talentosos da história da NFL teve uma grande queda de produção entre uma temporada e outra.
Agora na últimas semanas da temporada, o Packers está em uma sequência de 5 vitórias seguidas com grades atuações de Aaron Rodgers e a uma vitória de conquistar o título da NFC North.O que será que mudou entre um período da temporada e outro afinal?
Parte da resposta passa pelo crescimento da produção do supporting cast de Aaron Rodgers: Jordy Nelson. Davante Adams e Jared Cook estão rendendo mais, a OL é ótima bloqueando para o passe e parece que encontraram um bom RB no seu própio corpo de WRs em Ty Montgomery.
Mas isso não explica algumas más atuações de Rodgers nos primeiros jogos da temporada.Algumas vezes ele parecia desnorteado e ansioso para sair do pocket prematuramente e estender a jogada.Por que isso acontecia?
O dilema de Rodgers e McCarthy – Ataque em 2 “fases”
Aaron Rodgers é conhecido por sua mobilidade e habilidade de estender as jogadas.Isso fez com que ele deixasse registrado em vídeo jogadas espetaculares.
Mike McCarthy é um técnico conhecido por ser um especialista na chamada West Coast offense.Esse é um tipo de ataque conhecido por demandar precisão em passes curtos e ritmo/sintonia cirúrgicos entre QB e recebedor.Portanto, Um QB em um ataque West Coast precisa de paciência para administrar seu espaço no pocket e assim ter ritmo e precisão que o esquema pede.
Ter presença de pocket nunca foi problema para Aaron Rodgers, que levou o Packers aos playoffs por 7 temporadas seguidas nesse mesmo esquema West Coast.Mas a medida que Rodgers foi se desenvolvendo como QB, ele acabou se tornando mestre também em sair dos pocket e produzir aquelas jogadas espetaculares.
Mike McCarthy introduziu então em suas jogadas rotas de scramble específicas para tentar maximizar o potencial de big plays quando Rodgers decidisse sair do pocket para estender a jogada
Dessa forma o ataque aéreo do Packers é composto por 2 fases: A primeira é o jogo de passe ritmado que pede que o QB faça um rápido passe para um recebedor em sua progressão de leitura, e a segunda fase é quando Rodgers tenta estender a jogada e sair do pocket caso não encontre um recebedor livre na sua progressão de leitura.
A “primeira fase” precisa de ritmo e precisão, enquanto a segunda só precisa de um atleta fora de série como Aaron Rodgers para fazer mágica.Mas é aí onde se cria o problema: Se a “segunda fase” começar a vir antes da primeira, o ritmo e a precisão necessários pra fazer a “primeira fase” dar certo vão pro espaço.
O ataque do Packers também usa de muitas rotas isoladas.Isso é: Rotas que não fazem parte de uma combinação de rota para desestruturar uma defesa.Nessas rotas o WR precisa bater uma marcação por si só.
Junte essa informação ao fato de que no começo da temporada o WR Jordy Nelson não estava jogando a todo seu potencial (voltando de uma séria contusão), o que fazia com que a primeira leitura de Aaron Rodgers numa jogada, que geralmente era Nelson, não estivesse livre para receber o passe.Rodgers, ao se dar conta que sua primeira leitura não está livre, tentava estender prematuramente a jogada, saindo do pocket e usando dessa “segunda fase” do ataque do Packers com as rotas pré-determinadas para situações de scramble, em busca da big play.
A jogada abaixo ilustra bem como essa segunda fase do ataque funcionava.A partir do momento que Rodgers sai do pocket para estender a jogada, as rotas corridas pelos recebedores mudam de direção.Nessa jogada a rota Post do WR (#17) Davante Adams vira uma rota Fade no momento em que Adam percebe que Rodgers tem a intenção de sair do pocket.
Como era de se esperar, essa transição para a “segunda fase” nem sempre dava certo.Principalmente quando Rodgers não conseguia sair do pocket.
A jogada abaixo foi no primeiro jogo com o Vikings no começo da temporada.Em uma 3rd and 4, Rodgers precisa apenas de um passe curto e preciso para conquistar o 1st down.No entanto, depois do snap nenhum recebedor fica claramente livre.Apesar disso ele ainda poderia ter feito um passe rápido e preciso na esperança de que o recebedor conseguisse fazer a recepção.Mas em vez disso, ele tenta passar para a segunda fase do ataque e sair do pocket.O Vikings tinha mandado uma blitz com 5 jogadores, então ele acaba não tendo espaço para escapar do pocket e tem que jogar a bola fora pra não ser sofrer o sack.
Na jogada abaixo, o objetivo da “segunda fase” do ataque do Packers fica ainda mais claro.O WR (#17) Davante Adams corre uma rota Smash, e com o CB alinhado em Off, incialmente ele fica completamente livre para fazer a recepção.Essa é uma situação de 2nd and 10 e esse passe normalmente deveria ter sido feito.No entanto, Rodgers tenta entrar mais uma vez na “segunda fase” do ataque.A rota Smash de Adams na “segunda fase” se transforma em uma rota Seam.Porém, o problema é que Rodgers mais uma vez não consegue sair do pocket para ter espaço e fazer um bom passe para Davante Adams.
Achando o equilíbrio entre as “fases”
Na partida contra o Seahawks na semana 14 da temporada, o ataque do Packers deu indícios de que conseguiu achar um bom equilíbrio entre as 2 “fases” do ataque.A chave para isso, além do crescimento da produtividade dos WRs, foi um Aaron Rodgers que se mostrou mais paciente em passar pela progressão de leitura da primeira fase, fazendo passes precisos para seus recebedores.
Na jogada abaixo, vemos que Rodgers não hesita em fazer o passe para a rota Hitch do WR (#18) Randall Cobb, dando a oportunidade para o WR de conquistar jardas após a recepção.
Já aqui acontece o mesmo com O WR (#87) Jordy Nelson, que achou espaço entre as zonas Underneath da cobertura e recebeu um passe rápido e preciso de Rodgers.
E já no primeiro drive desse mesmo jogo, o ataque do Packers consegue executar a “segunda fase” de seu ataque perfeitamente bem, transformando uma jogada que parecia morta em um TD.Nessa jogada, Rodgers começa sua progressão de leitura no lado esquerdo da formação e passa ao lado oposto, fazendo a transição para a “segunda fase”.A jogada de passe escolhida consiste no conceito de passe Stick (combinação de rota Stick-Flat) espelhado nos 2 lados da formação ofensiva.Mas na “segunda fase” do ataque, as rotas Stick se transformarão em rotas Wheel.A marcação do Seahawks é boa num primeiro momento, mas a transição para a segunda fase é feita de forma sincronizada entre Rodgers e Davante Adams.Rodgers consegue sair do pocket e faz um ótimo passe para o TD de Davante Adams;
Rotas isoladas dependem de um bom design de jogada
Um ponto onde o ataque do Packers continua sendo criticado é o uso constante de rotas isoladas uma da outra.Mas apesar disso, Mike McCarthy costuma estruturar bem suas própias jogadas para combater as tendências de cada defesa que ele enfrenta.
Um exemplo disso foi uma jogada feita no mesmo jogo contra o Seahawks.A defesa do Seahawks é conhecida por ser adepta da cobertura Cover 3 e suas variações.McCarthy sabe das variações da cobertura Cover 3 que o Seahawks costuma usar com base na formação do ataque.Nessa jogada, o design da jogada é pensado para atacar uma variação específica de Cover 3 que é usada contra formações 3×1 do ataque (Formações com 3 recebedores alinhados em um mesmo lado da formação e um isolado no lado oposto).
A defesa do Seahawks quando está em cobertura Cover 3 e se depara com uma formação 3×1, tende a usar uma variação de Cover 3 chamada Cover 3 Buzz Mable.Essa é uma cobertura Pattern-Match, o que significa que dependendo das rotas corridas pelos recebedores, as responsabilidades de alguns jogadores na cobertura pode mudar.
O Cover 3 Mable busca compensar uma fragilidade da cobertura Cover 3 contra uma rota vertical do recebedor #3 em uma formação 3×1.Assim, o Middle Linebacker (MLB) na jogada precisa ficar atento a uma rota vertical do recebedor #3 e marcá-lo se for o caso, enquanto que no lado onde tem apenas um recebedor a marcação se torna homem-a-homem.
Na jogada em questão vemos que o MLB (#54) Bobby Wagner no momento do snap se vira para o recebedor #3 da formação 3×1 do Packers, no caso o WR (#87) Jordy Nelson.Se Nelson correr uma rota vertical longa, Wagner precisa marcar ele e assim tirar pressão do Free Safety no meio do campo, enquanto que no lado oposto o WLB (#50) KJ Wright marca o RB (#88) Ty Montgomery homem-a-homem e o CB (#35) D. Shead também marca o TE (#89) Jared Cook homem-a-homem.
No entanto, a rota de Jordy Nelson não é vertical e longa, sendo apenas uma rota Stick.Wagner então pode voltar a marcar a sua zona.A rota Slant corrida pelo TE (#89)Jared Cook,se destina exatamente a zona que Wagner agora está marcando.
Essa jogada mostra como o ritmo e a precisão são importantes no ataque do Packers: Quando Wagner retorna sua atenção a rota Slant de Jared Cook depois de ter lido a rota de Jordy Nelson, já é tarde demais.O passe é tão rápido e preciso que não tem como Wagner dar apoio a marcação e impedir a recepção de Jared Cook.E a chave para Wagner não ter conseguido dar apoio e impedir a recepção foi que McCarthy sabia que o Seahawks iria usar uma cobertura Cover 3 Mable nessa situação contra uma formação 3×1 do ataque, e que Wagner ficaria desatento a rota de Jared Cook por um momento, abrindo uma janela para o passe.
A recepção de Jared Cook em uma rota isolada nessa jogada não foi obra do acaso, e sim uma jogada muito bem pensada e que produziu o resultado esperado.
Conclusão
O ataque do Packers não vinha rendendo o esperado nas primeiras semanas da temporada, o que levou a muitas críticas direcionadas a Rodgers e McCarthy. Eu particularmente acho que McCarthy deveria introduzir mais conceito de passe com combinações de rota e também conceitos para se aproveitar do atleticismo e velocidade de Rodgers, como o Read Option.
Mas uma coisa que não dá pra negar é a competência de McCarthy para desenhar jogadas pensando em atacar as fragilidades específicas do adversário.Se o ataque do Packers continuar preciso e afiado como uma faca, e Rodgers saber a hora de usar a “segunda fase” do ataque, o Packers pode chegar longe na pós-temporada.